segunda-feira, 17 de janeiro de 2022

O ENSINO RELIGIOSO NO BRASIL - DO REINO AO CONGRESSO, RETROCESSO OU CONQUISTA

Desde a chegada dos Jesuítas, em 1549, trazidos pelo Governador Tomé de Souza, o  religioso no Brasil passa por transformacoes contundentes, sempre obedecendo interesses "politicos", tanto por parte do governo brasileiro, quanto da igreja. No entanto, independente desses interesses, quais implicações podemos de fato observar na sociedade com o ensino religioso? Tem prejudicado a sociedade, as famílias ou qualquer grupo social? Quais os limites da laicidade do Estado?

Vamos tentar entender a importância do ensino religioso para a sociedade brasileira, identificando os limites e razões que precisam ser obedecidos, a fim de atender as diretrizes tanto política quanto da igreja com suas várias representações eclesiásticas.

Essa é uma discussão muito antiga e podemos dizer que está longe de se chegar a um consenso que agrade todas as faces desse complexo debate. Desde a expulsão dos Jesuítas de Portugal e suas colônias, em 1759, pelo Marquês de Pombal que é observado, que eram os responsáveis pelo ensino nas escolas naquele tempo. Essa saída dos Jesuítas só deslocou a responsabilidade pela educação para outro grupo, dentro da própria igreja católica. Em 1824, quando começa a vigorar a primeira Constituição do Brasil - "Constituição Política do Império do Brazil" - outorgada por D. Pedro I no dia 25 de março daquele ano. A carta estabelece que a religião Católica Apostólica Romana continuaria a ser a Religião do Império.

Esse fato é importante observarmos, pois desde então começam várias fases que o Estado brasileiro passa, com apresentação de leis que tentaram harmonizar a presença da igreja no Estado, limitando a sua influência no governo.

Em 1890 é iniciada a segunda fase desse distanciamento entre a Igreja e o Estado, a fase conhecida pelos historiadores como Regime jurídico de Plena Separação Estado-Religiões, regida pelo Decreto 119-A, assinado pelo presidente Manoel Deodoro da Fonseca, que proibia a intervenção da autoridade federal e dos Estados federados em matéria religiosa e consagrava a plena liberdade de cultos.

Desde então, o regime republicano passou por várias transformações, o ensino religioso também tem acompanhado essas transformações, se adaptando aos interesses políticos,  enquanto também enfrenta suas mudanças, numa sociedade que evolui desde a chegada do Jesuítas, quando se instalou a primeira fase dessa relação em 1549, identificada pelo Regime jurídico de União Estado-Religião, nesse caso, a União com a igreja Católica.

Podemos destacar que a sociedade brasileira dessa época era constituída pela sua maioria por cristãos católicos, não encontrando grande dificuldade de catequização dos índios, até porquê, analisando desde a primeira ação do navegador Pedro Álvares Cabral, que foi a celebração de uma missa no Monte Pascoal, e os registros de Pero Vaz de Caminha, o alvo principal era a evangelização dos Índios, que desde as primeiras linhas feita por esse importante integrante da comitiva de Cabral, são descritos como povos inocentes que iriam se converter sem maiores problemas.

Fica evidente que havia uma parceria entre o governo de Portugal e a Igreja, ambas unidas por um desejo comum - o poder - primeiro de expandir seu território físico, o segundo o seu território de influência. Estamos vendo as duas faces de uma mesma moeda. Recomendo a leitura do artigo O ESTADO, A RELIGIÃO E A CIÊNCIA - A LUTA PELO PODER.

Essa fase estendeu até 1931, quando o Presidente Getúlio Vargas inaugura Regime jurídico de Separação Atenuada Estado-Religiões, sendo esta a terceira fase, quando por Decreto o Presidente reintroduz o ensino religioso nas escolas públicas de caráter facultativo. Em resposta a essa ação estatal, surge um movimento, perpetrado pela Coligação Nacional Pró-Estado Leigo, composta por representantes de todas as religiões, além de intelectuais, como a poetisa Cecília Meireles. Essa Associação fundada no Rio de Janeiro, então Distrito Federal, em 17 de maio de daquele ano. Eles tinham por objetivo defender o princípio da absoluta separação entre os poderes temporal e espiritual, garantido pelas disposições contidas no artigo 72 da Constituição de 1891. Segundo do estás, o Estado não reconhecia quaisquer práticas religiosas, mantendo-se assim separados a Igreja e os poderes públicos. 

Sendo assim, em 1934 é promulgada uma nova Constituição, cujo artigo 153 definia que O ensino religioso seria de frequência facultativa e ministrado de acordo com os princípios da confissão religiosa do aluno manifestada pelos pais ou responsáveis e constituiria matéria dos horários nas escolas públicas primárias, secundárias, profissionais e normais".

Essa situação permaneceu assim até 1946, quando uma nova Constituição passa a valer em 18 de setembro daquele ano, com a seguinte redação: "O ensino religioso constitui disciplina dos horários das escolas oficiais, é de matrícula facultativa e será ministrado de acordo com a confissão religiosa do aluno, manifestada por ele, se for capaz, ou pelo seu representante legal ou responsável.",  com pouca mudança notada, mas o processo de total separação entre o Estado e Religião evoluía é estava longe de acabar.

Até que em 1961 A primeira Lei de Diretrizes e Bases (LDB 4024/61) propõe em seu artigo 97, o seguinte: "O ensino religioso constitui disciplina dos horários das escolas oficiais, é de matrícula facultativa, e será ministrado sem ônus para os poderes públicos, de acordo com a confissão religiosa do aluno, manifestada por ele, se for capaz, ou pelo seu representante legal ou responsável. § 1º A formação de classe para o ensino religioso independe de número mínimo de alunos. § 2º O registro dos professores de ensino religioso será realizado perante a autoridade religiosa respectiva."

A Constituição Federa de 1967 passoy a adotar o ensino religioso, com as seguinte redação: "O ensino religioso, de matrícula facultativa, constituirá disciplina dos horários normais das escolas oficiais de grau primário e médio."

Nesse processo evolutivo a igreja foi perdendo sua influência a cada nova ideologia política assumia o poder. Em 1971 ficando evidente essa perda de poder na segunda LDB (5692/71) onde constatamos: "Art. 7º Será obrigatória a inclusão de Educação Moral e Cívica, Educação Física, Educação Artística e Programas de Saúde nos currículos plenos dos estabelecimentos de lº e 2º graus, observado quanto à primeira o disposto no Decreto-Lei n. 369, de 12 de setembro de 1969. Parágrafo único. O ensino religioso, de matrícula facultativa, constituirá disciplina dos horários normais dos estabelecimentos oficiais de 1º e 2º graus".

Com a promulgação da Constituição Federal de 1988, com a saída do governo militar, e agora o Brasil sobre a égide desse novo instrumento, também conhecida como a Constituição Cidadã,  passa a vigorar uma nova orientação jurídica, com a seguinte redação: artigo 210, parágrafo primeiro: "O ensino religioso, de matrícula facultativa, constituirá disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental". O artigo 5 define ainda: "é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias". No artigo 19, consta também que: "É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: I - estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los, embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com eles ou seus representantes relações de dependência ou aliança, ressalvada, na forma da lei, a colaboração de interesse público; II - recusar fé aos documentos públicos; III - criar distinções entre brasileiros ou preferências entre si."

Desde então,  sob uma nova perspectiva política, na tentativa de se adotar um convívio social mais plural, garantindo direitos individuais e coletivos, a sociedade brasileira tem vivido com uma realidade social bem diferente, pois durante todo esse processo de separação entre o Estado e a Religião, a sociedade brasileira tem experimentado mudanças bem definidas em sua religiosidade, conforme podemos notar na última pesquisa demografica do IBGE, em 2010:

  • 87,85% Se identifica como cristão (católicos, evangélicos e outras religiosidades cristãs);
  • 64,92% de católicos (Igreja Apostólica Romanos e Brasileira, além dos católicos ortodoxos); e
  •  22,93% de evangélicos.
Essa atual realidade demográfica apresentada nessa pesquisa, também nos desperta para as disputas políticas no Brasil, que de certo modo, pela constatação de uma sociedade majoritariamente cristã de todas as classes, acabam sendo celeiro fértil de ideias que convergem mais para o pensamento de ideologia cristã em todos os seguimentos, inclusive no acadêmico.

Portanto, podemos concluir, que essa discussão que resulta na separação entre o Estado e a Religião no Brasil está longe de terminar, pois a sociedade brasileira é constituído por uma população majoritáriamente religiosa cristã, mesmo os denominados não cristãos,  são religiosos de outras crenças, que revelam uma cultura impregnada desde seu descobrimento.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

  • SOUSA, R. Os Jesuítas no Brasill. Dispo ivel em: https://mundoeducacao.uol.com.br/historiadobrasil/os-jesuitas-no-brasil.htm. Acesso em: 05/01/2022.
  • FGV. Coligação Nacional Pro-Estado Leigo. Disponivel em: http://www.fgv.br/cpdoc/acervo/dicionarios/verbete-tematico/coligacao-nacional-pro-estado-leigo. Acesso em: 15/01/2021. 
  • IBGE.  Censo 2010 - Amostra Religião. Dispinivel em: https://cidades.ibge.gov.br/brasil/pesquisa/23/22107. Acesso em 22/03/2021.
  • Parecer CNE/CP nº 5, aprovado em 11 de março de 1997. Interpretação do artigo 33 da Lei 9394/96. 
  • Parecer CNE/CEB nº 16, aprovado em 1º de junho de 1998. Consulta a carga horária do ensino religioso no Ensino Fundamental. 
  • Parecer CNE/CP nº 97, aprovado em 6 de abril de 1999. Formação de professores para o Ensino Religioso nas escolas públicas de ensino fundamental. 
  • Parecer CNE/CES nº 1.105, aprovado em 23 de novembro de 1999. Autorização (projeto) para funcionamento do curso de Licenciatura em Ensino Religioso. 
  • Parecer CNE/CEB nº 26/2007, aprovado em 5 de dezembro de 2007. Consulta sobre a legalidade da criação do Conselho Municipal de Ensino Religioso.


Nenhum comentário:

Postar um comentário

Muito obrigado pelo seu comentário. Assim que nossos editores fizerem a moderação do seu conteúdo, ele ficará visível nesse blogue.